quinta-feira, 23 de junho de 2011

Oca do mundo (Waly Salomão - 1944-2003)

dia sim dia não
noite não noite sim
o mesmo pesadelo
e o marasmo do seu padrão

a floresta cantante nos provocava calafrios
todos os sentenciados eram pendurados nos ganchos
uivos e guinchos e gritos e homens pensos como jacas maduras
verrugas dos sentidos dedurados nos quatro pontos cardeais
caimãs simulavam pirogas
tucanos morcegavam rasantes
corujas e bacuraus invocavam arrepios
abraços de tamanduá-açu
bigornas de aço de arapongas
cataratas desfocavam o cruzeiro do sul
painéis de capoeiras
e blocos de matas desciam cipós de circuitos fechados
olheiros do comando de macaco-prego
manipulavam as glandes das suas pirocas
como se fossem câmaras de video-vigilância
floresta cantante inenarrável
cuja nesga narrável não figura nunca nada de verossímil

dia sim dia não
noite não noite sim
o mesmo pesadelo
e o marasmo do seu padrão

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