sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Noturno resumido (Murilo Mendes - 1901-1975)

A noite suspende na bruta mão
que trabalhou no circo das idades anteriores
as casas que o pessoal dorme comportadinho
atravessado na cama
comprada no turco a prestações.

A lua e os manifestos da arte moderna
brigam no poema em branco.

A vizinha sestrosa da janela em frente
tem na vida um camarada
que se atirou dum quinto andar.
Todos têm a vidinha deles.

As namoradas não namoram mais
porque nós agora somos civilizados,
andamos no automóvel gostoso pensando no cubismo.

A noite é uma soma de sambas
que eu ando ouvindo há muitos anos.

O tinteiro caindo me suja os dedos
e me aborrece tanto:
não posso escrever a obra-prima
que todos esperam do meu talento.

2 comentários:

  1. Lindos os poemas por aqui.
    no dia em que meu pai faleceu você postou um sobre morte. foi uma grande coincidência...no final do mes passado. fico feliz em continuar a me aconpanhar... obrigada sempre...

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  2. Força pra sua família, Andressa! Imagino como devem sofrer com a ausência dele... A morte sempre rende belos poemas.

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