sábado, 17 de agosto de 2013

Não virá (Ivan Junqueira - 1934)

Quando virá? Não virá nunca.
Será sempre a garra adunca
encravada em minha nuca.
Será sempre essa verruma
que a memória me perfura
e o pensamento me empurra
para o túmulo da dúvida.
Será, não o sol, mas a chuva
cujas gotas caem mudas
sobre o inútil latifúndio
onde tudo enfeza e murcha.
Será a alma na penumbra,
alheia ao êxtase e ao júbilo,
sobre si dobrada em ruga
e atenta apenas ao curso
do tempo e de suas curvas,
desse rio em cujo fluxo
somente uma vez mergulhas.
Será talvez, quando muito,
essa espera taciturna,
essa volúpia da luz
que soluça ao fim de um túnel
jamais percorrido a fundo.
Não virá, não virá nunca.
E lá estarás, ao crepúsculo,
sem esperanças nenhuma,
o rosto absorto, mediúnico,
sem mover sequer um músculo.

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