sexta-feira, 11 de abril de 2014

Aparição (Thiago de Mello - 1926)

Ela oscila ondulante descendo
o barranco ensolarado, vem no vento,
bacia de roupa quarada na cabeça;
é altivo o corpo, os cabelos brilham.
Vem sozinha no sol do meio-dia.
Uma estátua luminosa em movimento.
Ela nem olha o barco que passa.
Quando chega rente à margem
arria a bacia no capim
e some inteirinha no rio.
Quando reaparece, só a cabeça de fora,
a cabeleira se espalha refletindo
a claridade do mormaço. Então ela ri,
não era para o barco: para a vida.
De repente, ágil, sobe no tronco
amarrado na beira e abre os braços,
de costas para o rio.
Da camisa ensopada transparece
um resplendor de nádegas. Espáduas
vastas no fulgor do dia. Foi fugaz.
Na memória perdura, sol e água,
o milagre da moça iluminada.

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